A paixão não é só nacional. Partidas de futebol aguçam a identidade cultural e despertam um espírito de união em qualquer país. Fútbol: The Beautiful Game, apelido dado ao esporte pelos comentaristas de língua inglesa, foi, assim, a expressão perfeita para nomear amostra, dedicada à Copa do Mundo, que abre neste mês no Lacma – Los Angeles County Museum of Art –, em cartaz até 20 de julho. “A beleza está também na essência do jogo, que pode acontecer com quase nada. Apenas a bola”, afirma o curador Franklin Sirmans.
Essa poesia é ressaltada na simples (mas não simplória) animação do sul-africano Robin Rhode. Hondjies, em que quatro garotos jogam com uma bola desenhada em um muro da periferia de Los Angeles, é delicadamente rude e nos faz lembrar do motivo pelo qual nos reunimos em um campo: o jogo, e não o clima poderoso e competitivo que norteia a Copa.
O sistema, no entanto, não é alheio às artes plásticas (e vice-versa). Queridinho do mundo artsy, o americano Kehinde Wiley foi comissionado pela Puma para pintar atletas de 12 times africanos, a fim de celebrar a união do continente que sediaria a Copa em 2010. Conhecido por retratar anônimos em poses heroicas, majestosas ou bucólicas, referindo-se às obras dos antigos mestres, o artista tirou Samuel Eto’o, John Mensah e Emmanuel Eboué do gramado e os mergulhou em sua fusão de estilos, que vai desde o rococó francês até a arquitetura islâmica, passando pelo design têxtil do oeste africano e pela cultura hip-hop. O mix entre a história da arte e o futebol também comanda as obras expostas do Generic Art Solutions, grupo de New Orleans que faz fotos com composições típicas de cenas famosas, como A Morte de Marat, A Liberdade Guiando o Povo e Pietà.
A magia desse esporte, no entanto, acontece quando o curador Franklin coloca duas obras-chave em uma mesma sala. De um lado, o vídeo Volta, do francês Stephen Dean, composto por uma sequência de takes da torcida em partidas no Brasil. “Ele mostra que os jogadores são tratados como ídolos e colocados em pedestais, mas o show só se completa com a presença do espectador”, afirma. Do outro, Zidane: A 21st Century Portrait. No filme, o argelino Philippe Parreno e o escocês Douglas Gordon acompanham o craque do Real Madrid em uma disputa contra o Villareal, no dia 23 de abril de 2005. “A história traz um espetáculo inteiro sob a perspectiva de um herói que é, ainda, um artista enquanto jogador. E é extremamente bonito ver isso. Esta obra é pintura do nosso tempo”, emociona-se.
Naquele dia, Zidane acabou sendo expulso, o que totalizou 90 minutos de imagens. No momento em que sai do campo consolado pelos amigos, uma legenda com as palavras dele, que se aposentaria no ano seguinte, depois da Copa da Alemanha, diz: “A mágica está, muitas vezes, muito perto do nada... Nada. Quando eu me aposentar, vou sentir falta do verde do campo... Le carré vert.”
* Matéria publicada em Casa Vogue #342 (assinantes têm acesso à edição digital da revista)