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Viver sem registros

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Tino Sehgal (Foto: Divulgação)

Eu vivi. Não tenho fotos ou vídeos para provar, mas posso dizer que experimentei a obra de Tino Sehgal durante a última Documenta de Kassel. E o que resta? Memória. A descrição parece simples: o visitante entrava em uma sala escura e, aos poucos, começava a sentir pessoas à sua volta cantando e dançando. A sensação, no entanto, é inexplicável. Felizmente, neste mês, cariocas e paulistas terão a oportunidade de vivenciar suas “situações construídas” – atenção, o artista inglês radicado em Berlim não faz performances, visto que não participa fisicamente das obras, e estas são repetidas sistematicamente, diferentemente do gênero que despontou nos anos 1960.

A matéria-prima é o ser humano. A aposta é na memória. O objetivo é a interação com pitadas de crítica ao mercado de arte e a percepção do espaço. Em These Associations, por exemplo, cerca de 200 intérpretes selecionados por Sehgal e Asad Raza, braço direito do artista, vão caminhar, cantar, dançar e conversar com os visitantes que passarem pelo CCBB do Rio de Janeiro.

Contarão histórias íntimas e citarão poemas formando blocos que questionam a arquitetura do museu. A ideia é explorar relacionamentos interpessoais e trazer à tona a identidade do grupo a partir da subjetividade de cada integrante. Raza explica: “Nossa sociedade tem dificuldades em buscar a coletividade sem anular a individualidade de cada membro. Tino propõe novas formas de enraizamento coletivo, transformando o espaço expositivo em um experimento sociológico vivo”.

Tino Sehgal (Foto: @dingmusa)

O inglês não permite a documentação de suas obras, pois quer que o público viva o presente sem distrações – o que parece pertinente em tempos de mídias sociais, quando nada soa legítimo se não é registrado. “Nós nos acostumamos a experimentar tudo através das câmeras. Tino quer nos induzir a somente experimentar”, comenta Raza. O autor explica: “Respeito os pintores, escultores e fotógrafos. Por isso, não acho que uma foto do meu trabalho possa ser tão boa quanto uma imagem composta por um artista. Achar que tudo precisa estar acessível a todo momento é um clichê do nosso tempo. Quero voltar à época das estações quando só comíamos o que estava disponível naquele lugar ou momento”.

Que tipo de sensibilidade esperar de alguém que aos 11 anos passou a recusar presentes de Natal por se tratar de uma data muito comercial? Depois de estudar economia e dança, ele só acredita em sensações e subverte relações econômicas ao vender uma obra imaterial. Mesmo driblando regras do mercado (ou criando novas) – além de proibir qualquer registro visual ou auditivo, ele não assina nenhum contrato –, Tino vendeu suas “obras vivas” para o MoMA, Centre Georges Pompidou e Guggenheim. Rose Lord, diretora da Marian Goodman Gallery, explica: “A compra é feita como um contrato social, uma transição verbal. Ele senta na frente do comprador, acompanhado por uma testemunha, e declara as regras do trabalho. Sem dúvida, é um processo bem mais interessante do que vender telas ou esculturas”.

Não é só de câmeras e cláusulas que ele foge. Tino também não é fã de textos que tenta me explicar sua obra. “Se uma ideia precisa ser escrita para não ser esquecida, talvez não seja uma grande ideia.” Justo. Melhor me calar e esperar que o público sinta.

* Matéria publicada em Casa Vogue #343 (assinantes têm acesso à edição digital da revista)

Tino Sehgal (Foto: @magxx )

 

Tino Sehgal (Foto: @anastasiaklose)

 

Tino Sehgal (Foto: @auketts)

 

Tino Sehgal (Foto: @stephanbreuer_flying)

 

Tino Sehgal (Foto: @danejensen1)

 

Tino Sehgal (Foto: @onceupontomorrow)

 

Tino Sehgal (Foto: @hansulrichobrist)

 

Tino Sehgal (Foto: @auketts)

 

Tino Sehgal (Foto: @nowlim)

 

Tino Sehgal (Foto: @danejensen1 )

 

Tino Sehgal (Foto: Divulgação)

 

Tino Sehgal (Foto: @mmgaman )

 

 


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