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O tempo da cidade e o tempo da política

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Projetos públicos (Foto: Divulgação)

O papel social do arquiteto era, para mim, um discurso poético e distante, dada a urgência diária em apresentar soluções praticas para os projetos dos nossos clientes particulares, um tanto exigentes e apressados.

Para minha surpresa, tive a oportunidade de participar de dois projetos de cunho sociocultural pautados em requalificações de áreas públicas degradadas por meio de intervenções urbanas com o intuito de reverberar no seu entorno direto, e talvez resgatar a presença dos seus moradores para melhor qualidade de vida. Esses projetos ganham relevância com a proximidade das eleições, já que seu êxito ou fracasso dependem diretamente do envolvimento da política e da administração pública.

Projetos públicos (Foto: Divulgação)

O primeiro é o Parque das Letras, estudo encomendado pela entidade “Amigos do Pacaembu” para repensar um terreno mal cuidado, em desuso e abandonado em São Paulo, na encosta da rua Itatiba, área estritamente residencial com carência de espaços para recreação e ócio.

Projetos públicos (Foto: Divulgação)

Para tornar o lote em declive acentuado acessível, criamos um parque suspenso com platôs em deck de madeira biossintética, respeitando as árvores centenárias existentes. Pensamos em atividades culturais com arquibancada, playground, mesas de jogos e uma cobertura / concha acústica para pequenos eventos. Sobretudo, trata-se de um mirante para o bairro do Pacaembu, com o estádio em primeiro plano.

O segundo é fruto do Concurso Nacional organizado pelo IPAC para requalificação dos Largos do Pelourinho, em Salvador. Um dos largos, o Quincas Berro D’água, possui o mesmo caráter emblemático da proposta para o Pacaembu, mas é situado num miolo de quarteirão no Pelourinho, intersecção dos quintais das casas que o delimitavam. Neste caso, criamos uma nova topografia e o percurso entre duas ruas, com um traçado orgânico que se molda ao terreno, com áreas de sombreamento para rodas de capoeira, playground, bancos em meio às arvores, enfim, uma praça para todos.

Projetos públicos (Foto: Divulgação)

Ambos os projetos possuem potencial transformador, entretanto correm o risco de permanecerem apenas no papel. O que constato é que o processo de aprovação da maior parte dos órgãos públicos é desgastante e lento. Persistência não é suficiente, é preciso bastante teimosia para conseguir uma liberação. No caso do Parque das Letras, no Pacaembu, o emaranhado de secretarias e interesses fez com que o projeto ficasse parado. A falta de comunicação entre os órgãos dificultou o processo e mesmo com a sensibilização da comissão política da época (meados de 2011) e apoiados no Plano de Metas da Subprefeitura da Sé sobre Parque Temáticos, o projeto foi engavetado.

No caso do Pelourinho, estamos desde 2012 empenhados na elaboração do projeto, com trâmites pulverizados nos mais diversos órgãos. Insistimos no esforço de aprovação e apesar da boa vontade de vários desses órgãos, é forçoso constatar que o tempo da cidade não coincide com o tempo da política.

Projetos públicos (Foto: Divulgação)

Em véspera de eleições, cabe a reflexão sobre como votamos em prol de nossas cidades. De nada adianta concursos se o processo burocrático e político não permitirem que eles se tornem realidade. Pacaembu e Pelourinho são iniciativas notáveis, de um lado por uma ONG de bairro e do outro por órgãos do governo baiano, para reverter na pequena escala de praças o abandono da memória dos espaços urbanos. Minha expectativa é que um dia ambos os projetos saiam da prancheta, mas me dou conta da importância do engajamento social do arquiteto para que isso ocorra e da necessidade de sensibilizar a todos da centralidade da política na construção das cidades que queremos.

Projetos públicos (Foto: Divulgação)


 


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