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O luxo particular de Ugo di Pace

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  (Foto: Marcio Del Nero )

Em seis décadas de carreira, ele se ateve a um único estilo: o estilo Ugo di Pace. “Meus projetos têm um caráter único, inconfundível. Não há outra maneira de defini-los”, diz o arquiteto italiano radicado no Brasil desde 1948. E com razão. Como rotular uma proposta capaz de reunir peças tão heterogêneas como colunas romanas seculares, móveis do barroco mineiro e poltronas Barcelona, desenhadas por Mies van der Rohe em 1929?

“Sim, sou eclético. Mas prefiro dizer que componho os ambientes com bom gosto e espontaneidade”, arremata. Repertório para isso não falta: ao longo de seus 86 anos, Ugo estudou arquitetura e música (formou-se violinista, como a mãe, Elisa), tornou-se sócio de Pietro Maria Bardi em galerias de arte e dedicou-se ao mercado de antiguidades. “É preciso conhecimento para saber fazer escolhas”, justifica.

Ele, que assinou o Estúdio do Arquiteto na última Mostra Black, em São Paulo, concedeu esta entrevista à Casa Vogue no escritório que mantém em São Paulo (os outros dois ficam em Nápoles, onde nasceu, e em Nova York), espaço que divide com os filhos Raul e Maria.

A que se deve o estilo Ugo di Pace?

Ele é fruto da minha formação: desde muito cedo eu valorizava a arte, a música, a literatura. Sou filho de um engenheiro e arquiteto, dono de uma grande construtora, e de uma musicista com talento também para as letras – um de seus romances chegou a conquistar um importante prêmio literário. Além disso, na Itália, se aprende história da arte na escola, junto a matemática, ciências, geografia. Adquiri o gosto por esse universo e fui refinando-o com o passar dos anos. Esse conhecimento é fundamental para compor minhas criações.

  (Foto: Lew Parrella / divulgação )

O que não pode faltar em um bom projeto, independentemente do estilo?

Uma obra de arte de boa qualidade. E luxo, elegância. Luxo exige muito dinheiro? O que é luxo para você? O luxo tende a ser visto como algo fútil, mas está longe disso. Luxo é ser educado, informado, gentil e correto. E isso se reflete no que a pessoa escolhe vestir e usar na decoração da casa. Alguém com essas qualidades jamais comprará uma camisa cafona, por exemplo. E isso não é questão de dinheiro, mas de bom gosto.

Cada trabalho seu é muito particular. Como funciona o seu processo criativo?

Nunca gostei de desenhar layouts. Prefiro ir à casa do cliente, conhecer o espaço e as peças que ele já tem e então propor a ideia na minha cabeça. Há uma grande diferença entre mobiliar e decorar. Para mim, a arquitetura de interiores é um trabalho de artista. Uma sala vazia, por exemplo, é de início apenas um caixote, um retângulo, uma tela em branco. Mas, se eu colocar, por exemplo, duas portas de ferro forjado em estilo art déco nesse ambiente, dispuser a fotografia de uma paisagem atrás delas e um sofá de frente para essa composição, de onde o morador poderá contemplar o conjunto, o cenário é outro, completamente novo. Monto o projeto in loco, trocando os móveis e os objetos de lugar quantas vezes forem necessárias, até criar aquilo que eu acredito ser uma obra de arte.

 (Foto: Rômulo Fialdini/ divulgação)

Desde 2008, o escritório paulistano vive uma nova fase, em que a sua filha Maria, designer de interiores, se juntou a você e ao seu filho Raul, arquiteto. Como está sendo a experiência?

Muito boa. A Maria aprendeu comigo a garimpar, a querer peças exclusivas, mas com um apelo mais jovem. E o Raul é um artista incrível, capaz de desenhar obras belíssimas. Tenho muita admiração por ambos e um prazer enorme ao perceber que cada um desenvolveu seu próprio estilo.

Em 1948, você veio para o Brasil atraído pela promessa de encontrar as mulheres mais bonitas do mundo. Que outras belezas fizeram você ficar?

Cheguei aqui no pós-guerra e vivenciei uma época de ouro, o joie de vivre carioca daquele período. E, mesmo depois de tantos anos, acredito não haver país melhor para se viver. Sem falar que, de fato, o Brasil tem as mulheres mais belas do mundo.

  (Foto: Rômulo Fialdini/ divulgação)

Você passou por muitas fases do décor no Brasil. O que mudou dos anos 1950 para cá?

Quando eu comecei, a decoração não era tão popular, só quem tinha muito dinheiro contratava arquitetos e decoradores. Havia, de fato, uma meia dúzia de nomes extraordinários, como Roberto de Carvalho e Germano Mariutti. Hoje, existem milhares de profissionais fazendo esse trabalho, porque o número de clientes aumentou exponencialmente e as lojas são muito bem compostas – você entra e já tem uma ideia de como decorar sua casa. Mas, infelizmente, há muita mesmice.

Quais projetos seus você considera mais marcantes?

Não consigo definir um só. Gosto de todos os que criei até hoje. Sei que, quando faço algo, faço bem feito.

  (Foto: Rômulo Fialdini/ divulgação)

Depois de tantos anos de carreira, ainda existe algum projeto que você sonha realizar?

Honestamente, não. Não projeto para o futuro.

* Matéria publicada em Casa Vogue #336 (assinantes têm acesso à edição digital da revista)


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