O que era privilégio de poucos é colocado à disposição de todos. Seguindo (bons) exemplos internacionais, como Christian Boros, na Alemanha, François Pinault, na Itália, ou o casal Cisneros, nos Estados Unidos e na Venezuela, generosos colecionadores de arte no Brasil constroem espaços para exibir seu acervo ao público. Casa Vogue reúne aqui quatro iniciativas com formatos distintos, situadas em diferentes pontos do país. Uma delas é uma universidade, que acolhe a coleção particular de seu chanceler e se abre para a comunidade; outra é realização de uma artista plástica que oferece aos visitantes algumas horas junto à natureza e a um conjunto de obras com sua produção e de outros artistas; e os dois últimos são igualmente economistas, mas exibem espaços de dimensões opostas – um é macro, e o outro, minimalista. Todos disponibilizam ao público um patrimônio da cultura brasileira.
Instituto Figueiredo Ferraz
Ribeirão Preto
Os números impressionam: são 2.500 m² de área construída e um acervo de mais de 800 obras de arte contemporânea. Há ainda um auditório para 60 pessoas, biblioteca e jardim. Tudo começou como simples “desejo de preencher as paredes da casa com coisas que me agradassem”, conta o colecionador João Carlos de Figueiredo Ferraz. Eram os anos 1980 e ele acabava de chegar a Ribeirão Preto, vindo de São Paulo. “O prazer aos poucos foi se transformando em paixão, lotei todas as paredes, até que precisei começar a guardar as obras em armazéns.” Durante a construção de uma área para abrigar o acervo que vivia embalado, percebeu que o espaço não podia se restringir a ele e aos amigos. “Resolvi então transformá-lo em um instituto cultural e abrir para visitação”, diz. O Instituto Figueiredo Ferraz, projetado pela arquiteta Dulce de Figueiredo Ferraz, mulher de João Carlos e companheira na “aventura”, mantém uma mostra permanente com trabalhos de artistas do porte de Tunga, Antonio Dias e Nuno Ramos, e exposições temporárias, como As Tramas do Tempo na Arte Contemporânea: Estética ou Poética, curada por Daniela Bousso. Até 30 de dezembro.
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Coleção Particular
São Paulo
O esquema de visita à Coleção Particular é VIP: só com hora marcada e a garantia da presença do próprio colecionador, que acompanha o visitante em um tour guiado. Num beco sem saída arborizado do bairro de Pinheiros, um bloco cinza com pé-direito de 6 m – arquitetura moderna e o charme das galerias do Chelsea, em Nova York, mandam lembranças. Ali, o economista Oswaldo Correa da Costa monta a cada três meses uma nova exposição com base em seu acervo de cerca de 450 obras. Começou a coleção há mais de 30 anos e só agora está convivendo com ela, pois morou no exterior durante 27 anos. Em 2006, resolveu voltar e montar o acervo, com Adriana Varejão, Dudi Maia Rosa e Sergio Camargo, entre muitos artistas. Hoje, diverte-se revisitando-o. “As exposições são um pouco para mim também, pois comprei cada obra por algum motivo que renasce quando as coloco em uma mostra”, conta o colecionador. No mês passado abriu Tipo Montessori, uma brincadeira com a expressão “tipo brie”, para nomear o brie nacional. “A ideia é reler o ‘quarto Montessori’, onde todos os móveis têm a dimensão da criança. Por isso, chamei minha filha Olivia, de 13 anos, para selecionar as obras. Pendurei tudo na altura perfeita para os amiguinhos dela. Aos adultos, deverá ocorrer alguma estranheza.” Até 31 de março.
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Fundação Vera Chaves Barcellos
Porto Alegre
“Pertenço ao tipo de artista que se interessa pelo trabalho de outros artistas. Um dia tive a oportunidade de adquirir um Bicho de Lygia Clark, dos anos 60, e aí considerei que oficialmente estava começando uma coleção”, conta a artista Vera Chaves Barcellos, que instituiu uma fundação com seu nome para estimular e preservar a criação artística, além de conservar sua própria obra. O espaço foi construído numa área bucólica em Viamão, a 22 km de Porto Alegre, em uma antiga propriedade de sua família rodeada por um pomar – daí o nome da área de exposições, a Sala dos Pomares. Possui apenas 440 m², mas conta com um senhor acervo de aproximadamente 1.500 obras, de nomes como Mira Schendel, Nelson Leirner, Christo, Rosângela Rennó e Waltercio Caldas. A exposição Inéditos, ou quase..., aberta no mês passado, apresenta aos gaúchos cerca de 30 obras de Vera, desde objetos inéditos dos anos 1960, xerografias e fotografias dos anos 1970 e 1980 até trabalhos mais recentes. Destaque para a série Testartes, que a levou a representar o Brasil na Bienal de Veneza, em 1976. Até 14 de dezembro.
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Fundação Edson Queiroz
Fortaleza
Um tesouro da arte brasileira vem sendo formado silenciosamente nos últimos 40 anos, chegando hoje ao posto de um dos 15 acervos mais importantes do país. Outra surpresa: está fora do eixo Rio-São Paulo. Encontra-se no Ceará e foi aberto ao público neste ano. “A coleção de Airton Queiroz, presidente da Fundação Edson Queiroz, mantida dentro da Universidade de Fortaleza – Unifor, é a mais significativa entre as das universidades privadas do país. Em comparação aos das instituições públicas, o acervo só é superado pelo do MAC, da USP, e do Museu Dom João VI, da UFRJ”, afirma Paulo Herkenhoff, que curou a exposição inaugural do projeto. Para Trajetórias, ele selecionou 250 obras-primas da arte brasileira, representando artistas como Lasar Segall, Alfredo Volpi, Tarsila do Amaral, Antônio Bandeira, Candido Portinari e Antonio Dias. Até 8 de dezembro.
* Matéria publicada em Casa Vogue #339 (assinantes têm acesso à edição digital da revista)