
Bons enredos parecem estar sempre em busca de corajosos como Jenette Kahn. O sorriso expansivo da americana que comandou – e revolucionou – a DC Comics por 27 anos, como editora e presidente, dá uma pista de seu universo vibrante de cores e formas. Mas só ao entrar em sua casa no Harlem, em Manhattan, entende-se seu talento para criar histórias marcantes. Coleções de arte e design emocionam a cada esquina. Tudo coerente com a verve criativa de quem passou pela célebre revista Mad e, aos 68 anos, se mantém ativa à frente da Double Nickel Entertainment – produtora de filmes como Gran Torino (2008), dirigido e estrelado por Clint Eastwood. “Amei a DC, é o melhor trabalho da galáxia! Mas tenho a mesma paixão por filmes”, conta.

Ainda que tenha chefiado grandes companhias, Jenette jamais se limitou a agendas repletas de reuniões. O décor é tão visceral para ela, que, além de garimpar peças raras para a residência, levou-a a escrever 300 páginas de segredos e lições sobre interiores, no livro In Your Space (Abbeville Press, 2002), em que revela seu antigo escritório na DC, sua casa de campo e The Perfect House, como chama esta morada, seu “renascimento”.

Há 20 anos, estava divorciada quando encontrou o imóvel de 408 m², de quatro andares, necessitado de uma boa reforma. E se a vida imita a arte, é curioso e romântico o capítulo em que entra o herói Al Williams, empreiteiro, artista e jogador de xadrez de ranking internacional. No apartamento anterior, três eletricistas não foram capazes de resolver um problema sério, solucionado por Al de forma simples e com olhar silencioso – o que fisgou Jenette para sempre. A parceria se estendeu à renovação da construção e, depois, à vida. Há dez anos moram juntos e ele realiza os desejos ousados da amada. Como o teto majestoso da sala de jantar – ela teve a ideia, ele construiu – e as peças com design Campana, produzidas por ele com direcionamento de Fernando e Humberto.

Logo, a aventura de entalhar belas histórias pela casa se tornou mais divertida. Um mundo que não se prende a estilos, mas que pode levar ao drama ou à comédia. Na sala, a chaise Catwoman hipnotiza, enquanto no quarto presencia-se um bom embate: a cadeira Plástico Bolha, dos Campana, disposta em frente à mítica Red&Blue, de Gerrit Rietveld.

Mais do que causar surpresa, o design de qualidade precisa ultrapassar a matéria física para ser especial ali – que o diga a própria cadeira Jenette. No verão de 1998, em um almoço com a curadora de design do MoMA de Nova York, Paola Antonelli, Jenette se entusiasmou ao saber de uma exposição vindoura, Projects 66: Campana/Ingo Maurer. Era a estreia da dupla brasileira no museu. “Quando vi fotos do design dos Campana, fiquei elétrica”, lembra.
Na época, os “materiais modestos e a imaginação sofisticada” lhe serviram de pretexto para dar uma festa, em sua própria morada, na noite de abertura, com todos os envolvidos na mostra. “Eles são encantadores e humildes até hoje.” A amizade nascida ali trouxe a encomenda das cadeiras da sala de jantar. “Quando fui ao Brasil, vi que eram lindas, confortáveis e tinham o nome Jenette. Me emocionei.”

É a identidade que ela mais gosta que a casa assuma, a da emoção. “Fico feliz com os detalhes e também ao ver as coisas em diálogo entre si. Mas as muitas peças feitas pelos amigos, essas me trazem inspiração para viver.”
