
Tem gente que, quando se muda, muda tudo. Mas tem gente, como a arquiteta bissexta Raquel Silveira, empresária à frente da Mostra Black, que se muda de casa carregando muito do que tem e ainda reproduz no layout e no décor – de forma aprimorada – o que era bom no endereço anterior. É o caso deste seu novo apartamento no Jardim Europa, com vista para o rio Pinheiros, o Jockey Club e a parte mais moderna do skyline de São Paulo. Desde o hall do elevador, totalmente preto, com suas paredes de vidro e esculturas de chão iluminadas, até o hall interno, também negro, com as fotos em preto e branco de Mario Cravo Neto, a cor e o clima são os mesmos da antiga morada (em ambos os casos são projetos de sua autoria): é festa no ar!
Os grandiosos puxadores de latão das portas dão entrada ao salão generoso, com um living fora do comum – o sofá fica no meio e olha para todos os lados. À direita, se volta para a biblioteca, com as já famosas estantes forradas e tacheadas, desta vez de couro. À esquerda, se abre para a sala de jantar, com uma novidade: a cozinha está dentro dela e tem, logo à frente, outra cozinha funcional fechada. E, ao fundo, para a varanda original da planta, que foi integrada a esse generoso ambiente único, e onde todas as paredes possíveis foram abaixo. “A casa tem de mudar sempre”, diz a errante Raquel, que não consegue ficar parada por muito tempo. Nem em seus apartamentos daqui nem em Nova York, para onde vai sempre, pois lá tem casa há mais de 20 anos.

Sem preocupação com simetrias, ela aposta em uma corajosa mistura de materiais: veludo nas cortinas; tinta, vidro, espelho e madeira laqueada nas paredes e nas portas almofadadas e desenhadas por ela, como as maçanetas de metal dourado; carvalho-americano e granito em pedaços no piso da entrada; e gesso nas sancas iluminadas revividas, para manter o pé-direito alto. Assim, procura montar sua estratégia sutil de décor, como faz com seu business, uma receita de sucesso: “Para mim, decoração é proporção! E fiz essa casa dessa forma porque moro sozinha e em São Paulo (os três filhos vivem fora dali: a mais velha, também na capital paulista, o do meio em Santa Catarina e o mais novo em Boston), pois em outro local seria diferente”.
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Muitos móveis e objetos dos melhores antiquários se juntam a sofás, tapetes de pele ou estampados, de lã, marcenaria e serralheria contemporâneas com seu desenho, e ainda peças de design autoral brasileiro – a cadeira de Flávio de Carvalho, as mesas de Jacqueline Terpins, a mesa de jantar e os aparadores de Candida Tabet, amiga e ex-sócia, com quem já dividiu o projeto de outra de suas casas, na Bahia, como fez como ex-patrão Sig Bergamin, em Nova York. Lustres monumentais de cristal Baccarat, de Murano e de metal com folha de ouro complementam a iluminação automatizada, que cria moods diversos.

A arte acontece naturalmente, de todas as formas, de desenhos de Andy Warhol a esculturas como o charque de Adriana Varejão, a trança de Tunga, as ondas de Joaquim Tenreiro, um bicho de Rogério Degaki, pérolas de Luciano Carmo, entre outros exemplares. Das fotografias de Claudia Jaguaribe à coleção de caricaturas de J. Carlos e Manolo. “Preocupo-me em não repetir materiais no mesmo ambiente e fujo de casas datadas”, diz Raquel, que admira o estilo clean. “Adoraria acordar num lugar desse jeito, mas talvez me confundisse, pensando estar em uma loja.” Para ter uma casa assim, ela acha (diplomaticamente, como sempre) que fica meio sem personalidade – coisa que, definitivamente, não lhe falta.
* Matéria publicada em Casa Vogue #351 (assinantes têm acesso à edição digital da revista)






