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Por debaixo do tapete

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Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

Ele nasceu em Madrid (Espanha), estudou em Atenas (Grécia), viveu em Berlim (Alemanha), e agora trabalha em Bushwick, no Brooklyn (Nova York). Famoso por fazer gigantescas pinturas hiper-realistas de tapetes, Antonio Santin é um nômade nato. Seus interesses e influências, no entanto, revelam um artista (ainda) bastante enraizado.

Apesar do sucesso das telas com trompe-l'oeil de virtuosidade indiscutível, Antonio iniciou a carreira fazendo esculturas (aos curiosos, ele tem um monumento no centro de Madrid). “Acabei usando algumas técnicas da escultura nas minhas pinturas e um dia quero fazer o trabalho inverso: voltar a esculpir com o que aprendi pintando em mente. Mas, infelizmente, ainda não tive tempo para isso”, explica o artista em uma conversa por Skype

A partir de 2006, ele passou a procurar, então, modelos e tentava fazer uma espécie de natureza morta selecionadas em seus ambientes. Reparava muito nos vestidos destas mulheres, que pareciam envelopar algo que deveria ficar contido. O fetiche pelas roupas acabou se tornando tão predominante na composição, que o espanhol começou a expandi-las para os limites da tela. Adicionou uma pitada de humor negro e...Bingo: nascia a série tapete

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Editora Globo)


Ao olhar para seus trabalhos mais antigos – retratos de mulheres em posições um tanto passivas – e para as formas dos tapetes atuais, que lembram corpos humanos, conclui-se, em um primeiro olhar, que trata-se de cenas criminosas combinando sedução e perigo... Mas Antonio propõe camadas de significados muito mais profundas.

“Não interessa se os volumes são homens ou mulheres, se estão vivos ou mortos. São naturezas-mortas que falam de nossos segredos mais obscuros e mais profundos pesares", esclarece. O resto? Fica a cargo da imaginação do espectador. Influenciado pelo cinema noir, com uma dose de estética barroca, Antonio não quer me revelar muitos detalhes sobre o que estaria sob os tapetes...”Prefiro deixar no ar”, exclama.

Afinal, a grande questão aqui – vale lembrar – não é o tapete em si, como objeto, mas o que está entre o espectador e o que está atrás dele. O resultado? A dicotomia entre a beleza luminosa e o poder de atração dos desenhos perfeitos versus tudo aquilo de mais obscuro que queremos esconder debaixo do tapete.

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Essa vontade de ser enigmático, aliás, nasceu da admiração pelo cinema noir: “Trevas e luz. A superfície da tela contém a essência do volume, cuja fisicalidade permeia apenas no território da imaginação. Portanto, mesmo se tratando de um rosto, um vestido ou um tapete, é tudo sobre agarrar o que está oculto ou dissimulado.”

Ser dissimulado, aliás, é – para ele que viveu tanto tempo entre alemães e americanos – uma habilidade dos latinos. “As pessoas são muito diretas na Alemanha e nos Estados Unidos. Já na Espanha ou México existem sempre mensagens por trás de tudo...mil camadas e significados diferentes.”

Fã de artistas como Chema Madoz, Fred Tomaselli e Santiago Sierra, Antonio não deixa de lado os ensinamentos e revoluções dos grandes mestres da pintura espanhola na Idade de Ouro e usa a técnica do chiaroscuro para criar a sensação tridimensional. “É uma condição estética e moral com raízes profundas na cultura espanhola. A manipulação da luz conduz e, conscientemente, mergulha o espectador em um contexto teatral, na qual tudo é irreal. Apenas a pintura propriamente dita é real; o resto, uma ilusão.” As infinitas camadas de acrílico e óleo sobre tela também o ajudam nas texturas ricas e táteis.

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)


Ou seja, a textura colorida e hiper-realista atrai o olhar e, em seguida, desencadeia ou sedia – eventualmente – a psicologia única de quem vê. Confira, abaixo, hightlights do nosso papo.

O que você mais gosta sobre seu ateliê em Nova York?
É um loft com grandes janelas, tem pé-direito alto, luz natural e é relativamente calmo. Fica em um prédio industrial em Bushwick, um dos bairros do Brooklyn que está na moda e onde a maioria dos artistas se concentra. Os outros três edifícios que me cercam são um refúgio para sem-teto, uma fábrica de pão abandonada – locação para raves frequentes – e um armazém enorme de venda de produtos chineses por atacado.

Metade dos edifícios da área, aliás, pertence à comunidade chinesa, e a outra parte é dominada pela comunidade judaica chassídica, mas a população original é essencialmente latina. No entanto, o aumento de interesses sociais e imobiliários, acelerou o processo de “gentrificação” do bairro – o que começou a empurrar hipsterland até os confins da Ridgewood.

O que você escuta quando está pintando?
O que mais escuto enquanto eu trabalho é poesia. Há uma quantidade quase infinita de podcasts de Chacho Marzetti online. A combinação entre técnicas que eu uso – com as quais é fácil entrar em um fluxo de meditação – e sua voz é maravilhosa, as horas voam.

Você disse que hoje é difícil prender a atenção dos espectadores, acostumados a outros ritmos que nada têm a ver com o tempo da pintura – o da televisão, por exemplo.  Como um pintor pode lidar com a nova ideia de tempo no mundo de hoje?
Como disse Oscar Wilde "Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe". A atenção tornou-se um recurso cobiçado e escasso, pois a saturação de informações nos deixa indiferente ou ansioso – dois estados inadequados para a contemplação silenciosa.
Não basta, para o pintor, capturar um curto período de atenção de alguém porque a pintura sempre foi uma linguagem lenta que realmente só é entendida com o corpo. No entanto, algumas pessoas olham para uma pintura do mesmo modo que assistem TV, e por isso exigem mudanças radicais a cada “temporada”. Querem um enredo e esperam sempre mais...em um ritmo cada vez mais frenético.

Mas a realidade é que o tempo não existe na pintura e o pintor sempre esteve nu diante de sua própria desinformação. Por isso, é importante preservar certo isolamento, para ouvir a nossa própria voz claramente.

Você afirma que a obra não é apenas um objeto, mas um “gesto de fuga da neutralidade”. Poderia explicar esta afirmação?
Quando penso em arte primitiva me parece inconcebível o sentido da decoração. Acho que pintavam reflexões, um espelho que lhes garantia a transcendência e projeção para o futuro e sua leveza no mundo.

Este impulso permanece latente em cada ato criativo, o artista inevitavelmente mumifica suas circunstâncias de vida e, assim, se rebela contra a aparente aleatoriedade de sua existência e a ideia trágica de deixar apenas passos para o mundo. Toda a arte, no entanto, é essencialmente inanimada e é quem a aprecia (ou participa) que lhe dá fôlego. Assim, as testemunhas são tão importantes quanto o criador.

Você mencionou o filme noir. Há, de fato, o mesmo mistério nas suas pinturas. O que mais lhe atrai nesse tipo de cinema? Pode citar algum que você gosta?
Acho que a minha geração herdou e tem internalizado muitos dos clichês do cinema preto, banalizando-os com ajuda da cultura pop para digerir tudo como uma paródia cínica, nos privando de toda possível densidade psicológica ou ligação com a realidade.

Esse romantismo dark, como celebração de uma sexualidade oculta ou ocultada, é a fronteira que me interessa e tenho explorado em minhas composições. Minha relação com o noir é, de qualquer forma, tangencial e mais subconsciente que intencional.

As fronteiras do gênero são um tanto difusas, o primeiro filme que vem à mente é o Taxi Driver, um neo-noir que agora fiquei com vontade de rever.

Você foi um sucesso na última Basel de Hong Kong e acabou de se destacar na Art Stage Singapore. Por que, em sua opinião, suas peças tocam tanto os colecionadores asiáticos?
Há muitos aspectos da sensibilidade e espiritualidade oriental presente na minha vida diária. Também admiro e estudo os milhares de anos de visão artística deles. E isso, claro, enriquece meu trabalho. É uma influência desejada e cultivada que pode ressurgir nos aspectos mais delicados do meu trabalho. Quem sabe. Este vínculo transcultural pode vir à tona nesses detalhes, filtrados pelas minhas referências mediterrâneas.

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

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Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

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Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

Gemada: Por debaixo do tapete (Foto: Fran Parente / divulgação)

 

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