O arquiteto uruguaio Rafael Viñoly anda às voltas com muito barulho. Dois dos seus mais recentes projetos – o 432 Park Avenue, edifício residencial em Nova York, e o 20 Fenchurch Street, torre comercial em Londres – têm sido alvo das mais diversas críticas. O primeiro porque, com 425,5 m, rivaliza em altura com o Empire State (443 m) e o novo One World Trade Center (541 m), ameaçando a identidade visual do skyline mais conhecido do mundo. O segundo, pelas mesmas questões de inserção no contexto urbano, além de um episódio pitoresco. Na esteira da promoção do empreendimento nova-iorquino, Viñoly recebeu a Casa Vogue e um petit comité de jornalistas estrangeiros em seu escritório na Vandam Street, em Tribeca, onde falou sobre as duas obras e confidenciou: garantiu para si um dos exclusivíssimos apartamentos do 432.
Como é inscrever o seu nome no skyline de Nova York?
Pelo prédio ser alto demais, ou por eu ter feito algo bom? Dizer que é muito alto, em Manhattan, é precipitado. Esta é a única cidade verdadeiramente vertical do mundo. Não pelo talento arquitetônico de ninguém, mas pelo fato de ser uma ilha de área restrita que, por alguma razão, contém perto de 11 ou 12 milhões de pessoas. A única direção possível, aqui, é para cima. O edifício representa um fenômeno absolutamente intrínseco à cidade desde a sua origem – não é uma excentricidade.
O 432 Park Avenue parece isolado da cidade, assim como o 20 Fenchurch Street, em Londres. O quanto você levou em consideração o contexto das duas cidades ao criá-los?
Bem, é como tudo na vida: estão isolados até o dia em que não estiverem mais. É uma questão de tempo. Londres ainda não está acostumada a prédios altos. E uma das principais coisas sobre Nova York é que é a única cidade que você consegue ver como um todo, como se fosse uma maquete – ela não é tão grande. A distância entre o 432 Park Avenue e o One World Trade Center, por exemplo, não é considerável a ponto de fazê-los parecer desconectados um do outro. Além do que, nós, francamente, não nos importamos muito com esse tipo de contexto.
“Nós” diz respeito aos arquitetos, aos americanos, ou...?
Não existem americanos, existem nova-iorquinos. Estou falando da cidade de uma forma geral. Se você vive aqui, reclamar da altura dos prédios é o mesmo que se queixar do fato de a população local estar sempre mudando. Você pode gostar ou não, tem gente que vem para cá, fica uma semana e vai embora extremamente cansada... Mas não tem jeito, essa é a verdadeira vida urbana. O resto é outra coisa.
Como o prédio será lembrado na história da arquitetura?
Depende do que acontecer com a história da arquitetura, que não tem sido lá essas coisas. O problema no nosso negócio é que ele é muito político. Em comparação, se você não quer ver arte, salvo exceções, tudo o que tem de fazer é não ir ao museu. Mas se você quiser desligar a arquitetura, não pode, ela afeta a todos diariamente. Se este edifício se misturar e ninguém perguntar de onde ele veio ou quem foi que fez, está ótimo.
Então você prefere a discrição?
Eu sempre achei que o único cara que realmente soube trabalhar na arte foi o Giorgio Morandi, que ficava num quartinho, sem falar com ninguém, sem nada além de vasos e telas. Ou o Rothko, como ele. Esses artistas não participavam de nada. Eles não eram o Jeff Koons, não se envolviam nas controvérsias da arte. E são inegavelmente importantes. Essa é a diferença entre arte e arquitetura: é difícil saber quem é relevante de verdade. É um problema de educação. Isso a que chamamos de arquitetura é uma base de conhecimento absolutamente fundamental, que a gente só aprende quando a causa já está perdida. Aos 6 anos de idade, ninguém fala nada a você a respeito disso. A arquitetura não é parte da educação básica.
Você poderia ter feito um edifício como o 432 Park Avenue em algum outro lugar do mundo?
Acho que não. Nova York tem outra condição fantástica: o regulamento para a construção está todo escrito, não há necessidade de uma permissão específica para cada projeto [desde que esteja dentro das regras]. A autorização que você precisa não depende de um pedido, não é coloquial – é só fazer as contas. Que outro sinal você quer da inacreditável confiança na verticalidade do que uma cidade que não estipula altura máxima para os prédios? Isso não existe em nenhum outro lugar.
O formato do 20 Fenchurch Street, que os londrinos apelidaram de walkie-talkie, não é muito comum para arranha-céus, com topo maior que a base. Qual é a razão?
Muito simples: essa forma fez dele o edifício comercial mais bem-sucedido da cidade. Com área maior em cima, há mais vista. Hoje eu sou acusado de derreter um Jaguar [a fachada de vidro curva do prédio refletia os raios solares em direção à rua, um problema que está sendo corrigido], mas as pessoas esquecem que ganhei a concorrência para construí-lo porque coloquei um jardim na cobertura, um espaço público aberto 24 horas, de graça. Isso é arquitetura? Acho que sim.
*O jornalista viajou a convite da Macklowe. Properties e do CIMGroup.
*Matéria publicada em Casa Vogue #354 (assinantes têm acesso à edição digital da revista)