Nunca o vintage foi tão valorizado no design. Uma importante peça assinada, original e de época, tem o poder de transformar tudo ao redor. Deparar-se com um décor nitidamente contemporâneo ao qual foi adicionado um “toque vintage” hoje é hábito. Mas, e viver circundado só por móveis e acessórios das décadas de 1950 a 1970, e ainda por cima em um apartamento dos 60’s preservado na planta primordial? Curiosamente, o comerciante Teo Vilela Gomes, 38 anos, mora dessa maneira no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Detalhe: sem repetir o estilo de vida dos avós.
Paulista de Araçatuba, o advogado e designer de interiores Teo, à frente da loja e do galpão
homônimos especializados em mobiliário vintage que já arrancaram elogios do designer inglês Jasper Conran e do diretor de teatro americano Robert Wilson, não pretende, em casa, fazer um retorno a meados do século passado, embora seja aficionado e connoisseur. “Gosto do que me agrada, me faz feliz e é confortável”, diz. De 1962, o imóvel foi todo mantido, do piso de parquets
de peroba-rosa e marfim aos espelhos de luz de bronze. Nenhuma parede foi ao chão. Nenhum quarto integrou-se ao estar. Apenas os papéis de parede tipo chamalote foram banidos e as portas perderam as molduras exageradas.
Do seu quarto, Teo ouve o abrir do portão de sua loja, na calçada oposta. É hora de trabalhar, mas não sem antes buscar pães quentes na CPL, padaria mítica da rua, também famosa pelas fatias de pizza que atraem intelectuais atormentados e pinheirenses de coração à tardinha, e preparar seu suco de laranja em um espremedor de 30 anos, herdado da mãe. Escolheu morar ali pelo prazer de fazer tudo a pé: academia de dança, restaurantes como Le Jazz e Jacarandá, um passeio no vizinho Jardim Paulista. Com essa mesma despretensão e fluidez o lojista concebeu um décor que é 101% de época e não datado – de atuais, só eletrodomésticos como fogão e geladeira. “Sem jamais entulhar, componho a decoração de forma que a casa vai se tornando um quebra-cabeça. O jeito de colocar as peças a faz ganhar um ar contemporâneo.”
Explica-se. Só duas cadeiras de Joaquim Tenreiro acompanham a mesa de jantar de Florence Knoll, sob o lustre da FontanaArte que estava no apartamento, vindo da Dominici. Ao lado, uma mesa de centro da Forma é usada como aparador. Já a sala de estar revela uma configuração mais clássica, em que desfilam raridades brasileiras em um jogo cromático, de madeiras (caviúnas, jacarandás) e de firmas que fariam tremer apaixonados e colecionadores de qualquer canto do mundo: os sofás da Branco&Preto, a estante da L’Atelier, a poltrona Jangada, de Jean Gillon, que ainda exibe as originais cavilhas, a poltrona Alta, de Oscar e Anna Maria Niemeyer, o tapete geométrico da Santa Helena, o móbile anônimo usado nas filmagens do longa-metragem Flores Raras (2013), de Bruno Barreto.
Teo não esconde que está na chuva a negócio – chegou a receber clientes em sua casa para
mostrar itens mais especiais. Porém, a alma de comerciante é abrandada quando o assunto é consumismo exagerado e prazo de validade. “Gosto do móvel de boa construção, que não se estraga com o uso. Fico contente em vender peças atemporais e nunca deixo de dar dicas aos compradores sobre sua manutenção. TV que não tem vida útil, por exemplo, me deixa bravo.” Dinâmico e inquieto, ele está sempre atento ao design feito hoje – “o que não deixa de ser um segundo plano”, entrega. Um velho novo jeito de morar e conduzir a vida, com os olhos no passado e preocupações totalmente contemporâneas.
* Matéria publicada em Casa Vogue #355 (assinantes têm acesso à edição digital da revista)