O termo pre-war building, nos Estados Unidos, é usado para se referir a um edifício erguido entre 1900 e 1940, antes da Segunda Guerra. Em Nova York, os apartamentos nestes prédios são disputados não só por seu valor histórico, mas por serem mais espaçosos, possuírem pé-direito mais alto que o das construções atuais e ainda apresentarem detalhes nobres, como piso de madeira de verdade, acabamentos elaborados, paredes de alvenaria (em vez de dry-wall) e uma lareira bien placé no living. Muitos desses condos luxuosos estão localizados na Park Avenue. É o caso deste, na esquina com a rua 79, região conhecida como Upper East Side, indicativa de poder, muito poder.
Reeditar o espírito de um apartamento clássico na elegante avenida foi o mote do projeto no 15º andar, de 350 m², com três suítes, pronto em fevereiro, assinado pelo arquiteto e decorador Jorge Elias.
“Fiz uma grande reestruturação arquitetônica e desenhei todos os acabamentos. O décor tem cores suaves e românticas, ótimas peças de arte e de mobiliário. É mais clean, mais iluminado, porém dentro do meu estilo”, diz o profissional, obrigado a fazer dez pit stops em Nova York por conta da obra, elaborada para um casal com filhos, ligado ao Brasil por laços familiares, mas que vive na Europa.
Após o hall, o visitante passa a uma galeria, com piso tradicional de mármore preto e branco. Centralizada na parede principal, está uma cômoda bombê, francesa, ladeada por um par de cadeiras de braço, inglesas, estilo Queen Anne. O conjunto é o que se convencionou chamar de chinoiserie, ou seja, móveis e objetos produzidos no Ocidente, com formas europeias e motivos ornamentais inspirados na arte e técnica chinesas, em moda no século 18, e agora revivida no décor dos dias de hoje, conforme atestam essas três peças.
O ambiente seguinte, o living, é um amplo salão de convívio que reúne também a sala de jantar e uma sala de TV dissimulada, pois o aparelho foi embutido atrás do espelho da lareira. Esta, de mármore entalhado ao estilo Luís XVI, acentua as proporções áureas do espaço e forma um eixo harmonizador. Sobre a cornija, apenas um par de pratos assinados por Picasso e nada mais (para quê?). Pertencem à série produzida pela cerâmica Madoura, em Vallauris, sul da França, de Suzanne e Georges Ramié, sócios de 1941 a 1971 do grande artista espanhol em sua criativa incursão no milenar artesanato do barro cozido.
Mas não é só isso. Ali, há mais dois objetos de desejo de colecionadores. Um deles está na parede. É a aquarela dos anos 1970 de Alexander Calder (1898-1976),que esteve no Brasil, em 1959, expôs no Masp e se deliciou com a simpatia e a informalidade dos nossos trópicos, conforme contam suas biografias.
O outro é a mesa de centro Table Bleue (1961-1963), um sanduíche de vidro e acrílico com o icônico pigmento azul registrado como International Klein Blue, a cor criada e que identifica o bad boy das artes francesas Yves Klein (1928-1962), incensado por sua obra monocromática. Klein desenhou a peça um ano antes de sua morte repentina, enquanto assistia, no Festival de Cannes, ao filme Mondo Cane, um cult chocante para a época, do qual ele participou. Coisas da história da arte.
*Matéria publicada em Casa Vogue #357 (assinantes têm acesso à edição digital da revista)